MITO, FILOSOFIA, CIÊNCIA E RELIGIÃO
Dedicatória.
Ana Paula
Vilela Moraes, (minha orientanda) Prazer e gratidão. Agradeço a dedicação, a
disponibilidade, a tranquilidade no trabalho, mais que isso, a contribuição
belíssima no texto. Obrigado de coração Ana pela transcrição segura e clara.
Menina esperta e de ouro. Seu brilho é resplandecente, transborda nele força,
coragem!
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Se os/as senhores/as
cultivam a preguiça, por gentileza, entendam, esse é um texto que exercita a
coragem. Quem for comigo até o parágrafo final, reservo uma surpresa. Não
resolve sair correndo para encontrar o presente. A cantora e compositora carioca, Paula
Toller, presentemente no planeta do solo. Toller, liderou a Banda Kid Abelha
até o ano 2016. Por ocasião de sua carreira solo, interpretou uma canção
fantástica, composta por Erasmo Carlos, segue um trechinho: “Eu vim porque? Pra
onde eu vou? Onde é que eu estava? Onde é aqui? Quem me mandou? Qual é o nome da
minha alma?” Não me venham dizer na aula, qual música professor? A canção já
está no WhatsApp! A canção é fundamentalmente
filosófica. Mas, qual a relação dessa canção com o título deste texto? Nosso
caminho é longo e, portanto, atenção, nunca é demais. Quando adentramos numa
floresta ou num lugar desconhecido é preciso ter cuidado, vigilância e atenção
a todo momento, existe sempre um bicho por perto, seja uma mosca ou pernilongos,
seja escorpiões e cobras, lagartos e jacarés. Não é bom dar de cara com leão a
rugir. Já escutei muita gente dizer: “Eu mato um leão um leão por dia.” Mentira,
papo furado, bobagem! Tá escondendo atrás da cerca. Acredito nisso não, exceto
quando vejo, homens e mulheres, jovens e crianças marginalizados/as, renegados/as,
rejeitados/as, oprimidos/as e excluídos/as da sociedade como tal, são esses que
matam um leão por dia, os/as desempregados/as, os/as que sofrem e passam fome,
os/as que choram buscando comida no lixo. Ai é outra conversa, daí, não existe
mito, ninguém mita ali. Ali se morre aos poucos, se degradam. Adianto, isso
aqui, transformei em palavras (teoria) a minha prática meu nobre camarada e
minhas amadas e queridas estudantes. Destarte, ao iniciar a leitura desse solo
complexo e extenso é preciso que tenham atenção, zelo, dedicação. Cuidado, com
o sono e com a preguiça. Já observei em alguma rede televisiva, uma preguiça
sendo devorada por uma espécie de águia. A lentidão, a frouxidão, o marasmo, a
moleza, o descaso com a leitura, certamente, não levará os senhores e senhoras ao
segundo parágrafo dessas breves linhas. Não entendo e nunca vou entender: um/a
estudante de pedagogia que faz frescura para a leitura me mata do coração. Pedagogia, mais que qualquer outro curso, vive
e deleita-se de leitura, tem prazer e se delicia com escrita! Pronto! Esse é o
termômetro principal para saber se os senhores e senhoras estão no lugar
adequado. Uma criança merece um/a
professor/a que tem a alma nua! Escreve Immanuel Kant, em 3 de dezembro de
1783, “A preguiça e a covardia são as causas por que os homens em tão grande parte,
após a natureza os ter há muito libertado do controle alheio (naturaliter maiorenses), continuem, no
entanto, de boa vontade menores durante toda a vida; e também porque a outros se
tornam tão fácil assumirem-se como seus tutores. É tão cômodo ser menor.”
Traduzindo, Kant, está a dizer, levanta seu/sua parasita, deixe de encostar nos
outros, assume sua vida, encara de frente o que deve encarar, que coisa,
caramba! A cobardia não é senão um comportamento, um estilo, um hábito que
anuncia a falta de coragem. Como meu pai dizia, (in memoriam) “Caboclo preguiçoso esse, você é um cabeça de salame,
estava ele a falar comigo. Mas, naquela época eu não dava conta (como diz por
aqui) de entender aquela sabedoria. A cobardia que Immanuel Kant expressa é um gesto
caracterizado pelo medo, pela vergonha. Mas, que vergonha é essa meu camarada,
minha nobre estudante. Vamos conhecer agora a distinção entre, mito, filosofia,
ciência, religião e senso comum, e por falar em mito, vamos ao que interessa.
Mito, o termo da
moda, no ápice da moda da política. Como dizem por aí, mitou! Mitou? O que
mitou? Mito, mito! Gritam as pessoas nas praças e ruas, picham os muros, postam
no face book ou instagram, escrevem em blogs, rabiscam paredes e carteiras, comunicam
pelo twitter - isso é uma festa para esse mundo imagético e tecnológico. Se alguém
consultar um dicionário qualquer encontrará várias definições, aqui está uma
delas, “Mito são narrativas utilizadas pelos povos gregos antigos para explicar
fatos da realidade e fenômenos da natureza, as origens do mundo e do homem, que
não eram compreendidos por eles. Os mitos se utilizam de muita simbologia,
personagens sobrenaturais, deuses e heróis. Todos estes componentes são
misturados a fatos reais, características humanas e pessoas que realmente
existiram.” https://www.significados.com.br/mito/.
Quando cursava
filosofia aprendi e nunca mais esqueci, mito é uma
representação fantasiosa da realidade. Definição
bacana e legal, a considero completa, nada lhe falta, os componentes
linguísticos são claros e objetivos. MITO É UMA REPRESENTAÇÃO FANTASIOSA DA
REALIDADE. Desde as primeiras civilizações o ser humano indaga sobre sua
existência, e sobre sua gênese. Sem dúvida, o ser humano é um ser inquieto,
mais que isso, é um ser pensante. A própria reflexão determina nele um perene
surgir de problemas. As perguntas foram e são perenes. Quem fez as estrelas? De onde venho? Quem fez a lua? Quem sou eu? Quem fez o sol? Para onde vou? Quem fez o universo? Não
há problema que o ser humano se coloca, em que ele mesmo esteja implicado. As
flores nascem, crescem e desabrocham em perfume, beleza e cor, depois morrem,
viram sementes para nascer novamente. Que força seria essa? Que movimento seria
esse? Alguém criou os seres? A tais perguntas, a tais indagações, sob o impulso
da fantasia criadora, a função dos mitos era sempre fornecer uma explicação
referente à natureza, dos acontecimentos da existência humana. E é em função
das mitologias que se desenvolveu a filosofia. Do mito desenvolveu-se a
racionalidade.
Por um lado, atrás
do mito, pode ser que consigamos atingir muito pouco da realidade, além do
mais, é muito complexo. No mundo mitológico, o que se vê, em grande parte é
fantasia, ilusão, mera fantasia. Presenciei isso na cidade que leciono, talvez,
80% da população votaram no Mito. Semana passada foram às ruas, pelo menos,
percebi muitos/as professores/as bolsonaristas. Agora é tarde senhores e
senhoras. Não foi por falta de aviso. Antes das eleições, o cara bate na cara da
previdência do infeliz Temer. Ao assumir o governo, Jair Bolsonaro, agora, bate
na cara dos trabalhadores, isto é, piora a farsa da previdência, acrescenta de
62 para 65 anos. Vão empurrar a charrete por toda vida! Afirmo com clareza e
sabedoria, o mito, sem dúvida, pode se transformar num terrível engano.
Por outro lado, o mito
quando bem contado, tem um papel fundamental na vida e na formação das
crianças. O mito, entendido como fábulas ou historinhas, sem dúvida,
obviamente, é um sonho lindo na educação infantil. Alguém aí recorda das historinhas ou fábulas que
ouvimos, quando contadas pelos nossos pais, mães, irmãos, irmãos,
professores/as?
Nesse mundo pós
moderno, uma ausência de clareza conceitual perpassa a sociedade contemporânea,
de modo a embaralhar e confundir sempre mais o sentido e o significado das
coisas, dos seres, dos objetos, do mundo, da realidade da própria existência do
indivíduo e da coletividade. O mito é uma espécie de véu que não nos permite
com clareza enxergar um pouco mais daquilo que estamos vendo ou presenciando. No
mundo da acumulação, da competição, da individualidade, o pensamento, as
palavras, as ações ou, o próprio agir humano fica restrito a esfera do processo
técnico cultural.
Donna Haraway e Hari
Kunzru (2009), em Antropologia do
Ciborgue - As vertigens
do pós-humano, expressa “Pois uma das
mais importantes questões de nosso tempo é justamente: onde termina o humano e
onde começa a máquina? Ou, dada a ubiquidade das máquinas, a ordem não seria inversa?:
onde termina a máquina e onde começa o humano? Ou ainda, dada a geral promiscuidade entre o humano e a máquina, não
seria o caso de se considerar ambas as perguntas simplesmente sem sentido? Mais
do que a metáfora, é a realidade do ciborgue, sua inegável presença em nosso
meio (“nosso”?), que põe em xeque a ontologia do humano. Ironicamente, a existência
do ciborgue não nos intima a perguntar sobre a natureza das máquinas, mas, muito
mais perigosamente, sobre a natureza do humano: quem somos nós?” A pergunta
sempre volta. O Que É Que Eu Sou? (Paula
Toller). Enquanto isso, lá no mundo da fantasia e da ilusão da política, as pessoas
gritam: mito, mito, mito, mitou! Que besteira! O conceito de mito foi criado,
inventado assim como qualquer outro. Historicamente,
o mito tem uma importância fundamental para o início da filosofia, na verdade,
isso representa exatamente o primeiro esforço que a humanidade faz para tentar
explicar as coisas como são. Podemos afirmar com segurança, os egípcios, os indianos,
sobretudo, os gregos, eles foram os primeiros a compreender o sentido
universalizante dos mitos. As primeiras comunidades perguntavam: por que está a
trovejar? A resposta era porque os deuses estavam encolerizados. De onde vinha a
brisa leve que toca levemente nosso corpo? Quem fez as estrelas e a lua dos
namorados? Por que os raios atravessavam o ar? As respostas eram sempre
respondidas de forma mítica e religiosa, a fantasia e a fábula faziam parte dessa
trajetória interpretativa. Inicialmente as respostas que os seres humanos
tinham sobre a existência, a origem do universo, a origem da natureza, do
cosmos - universo, dos deuses, eram respostas constituídas por explicações
míticas e religiosas. As respostas míticas são explicações que podem orientar a
fantasia, sobretudo, de uma criança, embora, não sejam adequadas para entender
a realidade em sua amplitude e dimensão, seja da intelectualidade ou da
espiritualidade. Aliás, nem a ciência, nem a filosofia, nem a religião, nem o
senso comum, podem esclarecer o mistério que cerca o ser humano.
O primeiro físico brasileiro
a ganhar um prêmio internacional, o Templeton,
uma espécie de condecoração, além da grana que recebeu, o carioca, Marcelo
Gleiser (1963) - (vídeos postados aqui no meu facebook em 19 de março), também, astrônomo, escritor, roteirista, professor
e pesquisador da Faculdade de Dartmouth, nos Estados Unidos, em entrevista para
uma rede televisiva, concluiu: “[...] existe, pelo menos nas perguntas que a
gente faz, essa aliança, essa vontade da gente tentar entender cada vez melhor
quem nós somos. Então quando você olha pra ciência dessa forma, com um pouco
mais de humildade, não com aquela arrogância “nós temos a resposta pra tudo”
você percebe que existe, pelo menos nas perguntas que a gente faz, uma
aproximação com as religiões. Obviamente as respostas são completamente
diferentes, né, a metodologia científica, como você falou, ela é precisa, ela é
matemática, e não tem nada a ver com a ideia da fé, né, uma entidade sobrenatural
seja ela qual for, mas, o questionamento humano que pra mim é a semente dessa
criatividade, tanto científica quanto espiritual, ela é essencialmente a mesma,
então, essa conversa de que ciência e religião “tão” sempre em guerra, ou de
que a ciência quer matar o Deus das pessoas é uma grande bobagem, a gente tem
que passar por cima desta história, entendeu? De que a ciência é inimiga da
religião, o que existe é uma espécie de, “é...” posicionamento da ciência e da religião que
precisam ser respeitados e não invadidos, entendeu? Então, os cientistas não
deveriam ter arrogância de dizer que sabem coisas que ainda não sabem, tipo,
por exemplo, como que o universo surgiu, e por outro lado, as pessoas
religiosas não deveriam jamais interferir tanto no andamento da ciência, onde certamente
“...” certamente no ensino da ciência na escola, essa ideia de você usar ideias
criacionistas que não são nem uma teoria no currículo escolar, pra mim, é uma
coisa profundamente trágica e aí que surge essa divergência entre ciência e
religião, não quando as duas são vistas pelo que realmente são, que é a expressão
que a gente tem de, maravilhamento com a existência humana e com o mundo que a
gente vive.” Portanto, as palavras do
entrevistado foram precisas, nem ciência, filosofia ou religião, ou, o próprio mito
são capazes de determinarem a plenitude do mistério humano. O caminho da ciência
é um, o da religião outro, e, portanto, ambos, distintos, do senso comum. Mas
preciso esclarecer algo, em todas essas esferas, paira a ignorância. Por isso,
cuidado, quem está seguro em cima do muro, pode cair.
Também, a
contemporaneidade está carregada de mitos, lendas, fábulas sobre a política,
artes, letras, economia - bolsas de valores, mercado, escola, a educação e
sobre o mundo inovador das novas tecnologias e, de um suposto aprendizado. Ainda,
sobre o mito, no mundo grego, especificamente, sob esse chão imaginário e
fabuloso que as respostas eram dadas, contudo, elas buscavam em certo sentido,
responder as angústias e interrogações humanas.
Entretanto, qualquer
conceito é sempre criado em determinada época e, com o passar dos tempos, o conceito
pode ampliar, variar, diversificar, pluralizar e, etc. E, por falar em conceito, adianto: filosofia, em suma, é criação
de conceitos. Diferentemente das demais ciências, a filosofia não tem pretensão
de resolver e nem dar soluções aos problemas os quais se defronta o homem. A
filosofia não é uma bola de cristal, nem uma mãe joana. Ela não traz em sua
bagagem respostas para as perguntas, muito menos, é uma detentora de soluções. É
preciso compreender de uma vez por todas, não existe filosofia da educação, ou,
filosofia da ciência, da história, da idade medieval, da robótica, da
contemporaneidade, do acaso ou do absurdo. O que existe é a filosofia e o que
dela se desprende. O que disso passa, são apenas formas didáticas ou
metodológicas para pensar determinadas realidades específicas, só isso. Quem
busca resposta é a ciência, a filosofia está longe disso, longe de obtenção de
respostas. A filosofia não é uma ciência, é um conhecimento, denominado
conhecimento filosófico. A filosofia é a arte de formar, de inventar, de
fabricar conceitos, ela traça, inventa e cria os conceitos. Essa noção de
filosofia é de Gilles Deleuze e Felix Guattarri (2004). Ao contrário daquelas
ou daqueles filósofos/as que tocam harpas com os anjos, afirmam eles/as: fazer
filosofia é ficar a olhar o céu, a natureza, o universo, os seres para
encontrar respostas. Nesse sentido, estou em total desacordo com eles e elas.
Abro parêntese, não estou generalizando, as filósofas são raras, poucas,
entretanto, geniais. Lembram do filme, de Hipátia de Alexandria a primeira
mulher filósofa e matemática. Simone de Beauvoir (1908-1986), Rosa de
Luxemburgo (1871-1919), Hannah Arendt (1906-1975), Anne Conway (1631-1679), Donna
Haraway (1944). Simone de Beauvoir afirmou em sua época “Era-me mais fácil
imaginar um mundo sem criador do que um criador carregado com todas as
contradições do mundo.” A genialidade de Hannah Arendt floresce quando afirma,
ao tentar falar de um ousado tema, “O que me perturba é que eu me atreva a
abordá-lo, porque não tenho a pretensão nem a ambição de ser uma filósofa, ou
ser incluída entre aqueles que Kant, não sem ironia chamava Denker von Gewerbe
(pensadores profissionais).” A moça sabe o caminha dela! Lindo isso! Enfatizo,
quem busca ou determina a resposta é a ciência, a filosofia está longe disso. A
filosofia não é uma ciência. Entendida como conhecimento, a filosofia é a arte
de formar, de inventar, de fabricar conceitos, ela traça, inventa e cria os
conceitos. Ao longo de nossas lições vamos aprofundar um pouco mais acerca de
seu sentido e de seu plano que a sustenta.
Sobre a religião,
basta prestar atenção nas palavras do físico Marcelo Gleiser, para ele,
enquanto a ciência é um flerte com o mistério, a religião deve conter em seu
lugar. Daí, afirmo, a religião deve tão-somente basta acender a vela da fé,
porém, na igreja. A escola não é templo. A historinha de Jesus Cristo repete
isso algumas vezes para os parasitas e surdos: “[...] quando orares, entre no
teu quarto e em silêncio ore ao senhor teu Deus, que, em silêncio, observa tudo
e, te recompensará. O templo faz parte dessa história, as igrejas devem sim
fazer o que se deve fazer e os fiéis devem orar e louvar juntos. A narrativa do
evangelho que contempla o tal Jesus, no qual afirmou: “Não faça da casa de meu
pai um covil de ladrões, muito menos um mercado” Isso é claro! Vou ter que
desenhar qualquer dia. Escola é escola, Igreja é igreja. Você já leu em algum
lugar na historinha de Jesus que esse, entrou numa escola para ensinar alguma
coisa? É cada uma que parece duas, dizia meu pai.
Sobre o senso comum,
de cara é preciso distinguir, senso comum da ciência, da filosofia, da
religião. Sempre ensino, fazer filosofia é saber distinguir o porco do leitão.
Porco é porco, leitão é leitão. O cara que me diz que é tudo a mesma coisa, logo
desconfio. Sou de Minas Gerais, bicho cabreiro e desconfiado. Se porco fosse
leitão, então, para que criamos o conceito de leitão? Que coisa maluca! Depois
sobram para os pobres filósofos a dimensão da loucura. Gostaria de um último
esclarecimento: o senso comum, ou seja, aquilo que a maioria das pessoas
compreendem, é totalmente diferente das estatísticas, do ibope. Tem algumas
pessoas que entendem que aquilo que dá ibope, é aquilo que é bom, é aquilo que
mita!