terça-feira, 26 de março de 2019


MITO, FILOSOFIA, CIÊNCIA E RELIGIÃO


Dedicatória.
Ana Paula Vilela Moraes, (minha orientanda) Prazer e gratidão. Agradeço a dedicação, a disponibilidade, a tranquilidade no trabalho, mais que isso, a contribuição belíssima no texto. Obrigado de coração Ana pela transcrição segura e clara. Menina esperta e de ouro. Seu brilho é resplandecente, transborda nele força, coragem!
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Se os/as senhores/as cultivam a preguiça, por gentileza, entendam, esse é um texto que exercita a coragem. Quem for comigo até o parágrafo final, reservo uma surpresa. Não resolve sair correndo para encontrar o presente.  A cantora e compositora carioca, Paula Toller, presentemente no planeta do solo. Toller, liderou a Banda Kid Abelha até o ano 2016. Por ocasião de sua carreira solo, interpretou uma canção fantástica, composta por Erasmo Carlos, segue um trechinho: “Eu vim porque? Pra onde eu vou? Onde é que eu estava? Onde é aqui? Quem me mandou? Qual é o nome da minha alma?” Não me venham dizer na aula, qual música professor? A canção já está no WhatsApp! A canção é fundamentalmente filosófica. Mas, qual a relação dessa canção com o título deste texto? Nosso caminho é longo e, portanto, atenção, nunca é demais. Quando adentramos numa floresta ou num lugar desconhecido é preciso ter cuidado, vigilância e atenção a todo momento, existe sempre um bicho por perto, seja uma mosca ou pernilongos, seja escorpiões e cobras, lagartos e jacarés. Não é bom dar de cara com leão a rugir. Já escutei muita gente dizer: “Eu mato um leão um leão por dia.” Mentira, papo furado, bobagem! Tá escondendo atrás da cerca. Acredito nisso não, exceto quando vejo, homens e mulheres, jovens e crianças marginalizados/as, renegados/as, rejeitados/as, oprimidos/as e excluídos/as da sociedade como tal, são esses que matam um leão por dia, os/as desempregados/as, os/as que sofrem e passam fome, os/as que choram buscando comida no lixo. Ai é outra conversa, daí, não existe mito, ninguém mita ali. Ali se morre aos poucos, se degradam. Adianto, isso aqui, transformei em palavras (teoria) a minha prática meu nobre camarada e minhas amadas e queridas estudantes. Destarte, ao iniciar a leitura desse solo complexo e extenso é preciso que tenham atenção, zelo, dedicação. Cuidado, com o sono e com a preguiça. Já observei em alguma rede televisiva, uma preguiça sendo devorada por uma espécie de águia. A lentidão, a frouxidão, o marasmo, a moleza, o descaso com a leitura, certamente, não levará os senhores e senhoras ao segundo parágrafo dessas breves linhas. Não entendo e nunca vou entender: um/a estudante de pedagogia que faz frescura para a leitura me mata do coração.  Pedagogia, mais que qualquer outro curso, vive e deleita-se de leitura, tem prazer e se delicia com escrita! Pronto! Esse é o termômetro principal para saber se os senhores e senhoras estão no lugar adequado.  Uma criança merece um/a professor/a que tem a alma nua! Escreve Immanuel Kant, em 3 de dezembro de 1783, “A preguiça e a covardia são as causas por que os homens em tão grande parte, após a natureza os ter há muito libertado do controle alheio (naturaliter maiorenses), continuem, no entanto, de boa vontade menores durante toda a vida; e também porque a outros se tornam tão fácil assumirem-se como seus tutores. É tão cômodo ser menor.” Traduzindo, Kant, está a dizer, levanta seu/sua parasita, deixe de encostar nos outros, assume sua vida, encara de frente o que deve encarar, que coisa, caramba! A cobardia não é senão um comportamento, um estilo, um hábito que anuncia a falta de coragem. Como meu pai dizia, (in memoriam) “Caboclo preguiçoso esse, você é um cabeça de salame, estava ele a falar comigo. Mas, naquela época eu não dava conta (como diz por aqui) de entender aquela sabedoria. A cobardia que Immanuel Kant expressa é um gesto caracterizado pelo medo, pela vergonha. Mas, que vergonha é essa meu camarada, minha nobre estudante. Vamos conhecer agora a distinção entre, mito, filosofia, ciência, religião e senso comum, e por falar em mito, vamos ao que interessa.

Mito, o termo da moda, no ápice da moda da política. Como dizem por aí, mitou! Mitou? O que mitou? Mito, mito! Gritam as pessoas nas praças e ruas, picham os muros, postam no face book ou instagram, escrevem em blogs, rabiscam paredes e carteiras, comunicam pelo twitter - isso é uma festa para esse mundo imagético e tecnológico. Se alguém consultar um dicionário qualquer encontrará várias definições, aqui está uma delas, “Mito são narrativas utilizadas pelos povos gregos antigos para explicar fatos da realidade e fenômenos da natureza, as origens do mundo e do homem, que não eram compreendidos por eles. Os mitos se utilizam de muita simbologia, personagens sobrenaturais, deuses e heróis. Todos estes componentes são misturados a fatos reais, características humanas e pessoas que realmente existiram.” https://www.significados.com.br/mito/.
Quando cursava filosofia aprendi e nunca mais esqueci, mito é uma representação fantasiosa da realidade. Definição bacana e legal, a considero completa, nada lhe falta, os componentes linguísticos são claros e objetivos. MITO É UMA REPRESENTAÇÃO FANTASIOSA DA REALIDADE. Desde as primeiras civilizações o ser humano indaga sobre sua existência, e sobre sua gênese. Sem dúvida, o ser humano é um ser inquieto, mais que isso, é um ser pensante. A própria reflexão determina nele um perene surgir de problemas. As perguntas foram e são perenes. Quem fez as estrelas? De onde venho? Quem fez a lua? Quem sou eu? Quem fez o sol? Para onde vou? Quem fez o universo? Não há problema que o ser humano se coloca, em que ele mesmo esteja implicado. As flores nascem, crescem e desabrocham em perfume, beleza e cor, depois morrem, viram sementes para nascer novamente. Que força seria essa? Que movimento seria esse? Alguém criou os seres? A tais perguntas, a tais indagações, sob o impulso da fantasia criadora, a função dos mitos era sempre fornecer uma explicação referente à natureza, dos acontecimentos da existência humana. E é em função das mitologias que se desenvolveu a filosofia. Do mito desenvolveu-se a racionalidade.
Por um lado, atrás do mito, pode ser que consigamos atingir muito pouco da realidade, além do mais, é muito complexo. No mundo mitológico, o que se vê, em grande parte é fantasia, ilusão, mera fantasia. Presenciei isso na cidade que leciono, talvez, 80% da população votaram no Mito. Semana passada foram às ruas, pelo menos, percebi muitos/as professores/as bolsonaristas. Agora é tarde senhores e senhoras. Não foi por falta de aviso. Antes das eleições, o cara bate na cara da previdência do infeliz Temer. Ao assumir o governo, Jair Bolsonaro, agora, bate na cara dos trabalhadores, isto é, piora a farsa da previdência, acrescenta de 62 para 65 anos. Vão empurrar a charrete por toda vida! Afirmo com clareza e sabedoria, o mito, sem dúvida, pode se transformar num terrível engano.
Por outro lado, o mito quando bem contado, tem um papel fundamental na vida e na formação das crianças. O mito, entendido como fábulas ou historinhas, sem dúvida, obviamente, é um sonho lindo na educação infantil.  Alguém aí recorda das historinhas ou fábulas que ouvimos, quando contadas pelos nossos pais, mães, irmãos, irmãos, professores/as?
Nesse mundo pós moderno, uma ausência de clareza conceitual perpassa a sociedade contemporânea, de modo a embaralhar e confundir sempre mais o sentido e o significado das coisas, dos seres, dos objetos, do mundo, da realidade da própria existência do indivíduo e da coletividade. O mito é uma espécie de véu que não nos permite com clareza enxergar um pouco mais daquilo que estamos vendo ou presenciando. No mundo da acumulação, da competição, da individualidade, o pensamento, as palavras, as ações ou, o próprio agir humano fica restrito a esfera do processo técnico cultural.
Donna Haraway e Hari Kunzru (2009), em Antropologia do Ciborgue - As vertigens do pós-humano, expressa “Pois uma das mais importantes questões de nosso tempo é justamente: onde termina o humano e onde começa a máquina? Ou, dada a ubiquidade das máquinas, a ordem não seria inversa?: onde termina a máquina e onde começa o humano? Ou ainda, dada a geral promiscuidade entre o humano e a máquina, não seria o caso de se considerar ambas as perguntas simplesmente sem sentido? Mais do que a metáfora, é a realidade do ciborgue, sua inegável presença em nosso meio (“nosso”?), que põe em xeque a ontologia do humano. Ironicamente, a existência do ciborgue não nos intima a perguntar sobre a natureza das máquinas, mas, muito mais perigosamente, sobre a natureza do humano: quem somos nós?” A pergunta sempre volta. O Que É Que Eu Sou? (Paula Toller). Enquanto isso, lá no mundo da fantasia e da ilusão da política, as pessoas gritam: mito, mito, mito, mitou! Que besteira! O conceito de mito foi criado, inventado assim como qualquer outro.  Historicamente, o mito tem uma importância fundamental para o início da filosofia, na verdade, isso representa exatamente o primeiro esforço que a humanidade faz para tentar explicar as coisas como são. Podemos afirmar com segurança, os egípcios, os indianos, sobretudo, os gregos, eles foram os primeiros a compreender o sentido universalizante dos mitos. As primeiras comunidades perguntavam: por que está a trovejar? A resposta era porque os deuses estavam encolerizados. De onde vinha a brisa leve que toca levemente nosso corpo? Quem fez as estrelas e a lua dos namorados? Por que os raios atravessavam o ar? As respostas eram sempre respondidas de forma mítica e religiosa, a fantasia e a fábula faziam parte dessa trajetória interpretativa. Inicialmente as respostas que os seres humanos tinham sobre a existência, a origem do universo, a origem da natureza, do cosmos - universo, dos deuses, eram respostas constituídas por explicações míticas e religiosas. As respostas míticas são explicações que podem orientar a fantasia, sobretudo, de uma criança, embora, não sejam adequadas para entender a realidade em sua amplitude e dimensão, seja da intelectualidade ou da espiritualidade. Aliás, nem a ciência, nem a filosofia, nem a religião, nem o senso comum, podem esclarecer o mistério que cerca o ser humano.
O primeiro físico brasileiro a ganhar um prêmio internacional, o Templeton, uma espécie de condecoração, além da grana que recebeu, o carioca, Marcelo Gleiser (1963) - (vídeos postados aqui no meu facebook em 19 de março), também, astrônomo, escritor, roteirista, professor e pesquisador da Faculdade de Dartmouth, nos Estados Unidos, em entrevista para uma rede televisiva, concluiu: “[...] existe, pelo menos nas perguntas que a gente faz, essa aliança, essa vontade da gente tentar entender cada vez melhor quem nós somos. Então quando você olha pra ciência dessa forma, com um pouco mais de humildade, não com aquela arrogância “nós temos a resposta pra tudo” você percebe que existe, pelo menos nas perguntas que a gente faz, uma aproximação com as religiões. Obviamente as respostas são completamente diferentes, né, a metodologia científica, como você falou, ela é precisa, ela é matemática, e não tem nada a ver com a ideia da fé, né, uma entidade sobrenatural seja ela qual for, mas, o questionamento humano que pra mim é a semente dessa criatividade, tanto científica quanto espiritual, ela é essencialmente a mesma, então, essa conversa de que ciência e religião “tão” sempre em guerra, ou de que a ciência quer matar o Deus das pessoas é uma grande bobagem, a gente tem que passar por cima desta história, entendeu? De que a ciência é inimiga da religião, o que existe é uma espécie de, “é...”  posicionamento da ciência e da religião que precisam ser respeitados e não invadidos, entendeu? Então, os cientistas não deveriam ter arrogância de dizer que sabem coisas que ainda não sabem, tipo, por exemplo, como que o universo surgiu, e por outro lado, as pessoas religiosas não deveriam jamais interferir tanto no andamento da ciência, onde certamente “...” certamente no ensino da ciência na escola, essa ideia de você usar ideias criacionistas que não são nem uma teoria no currículo escolar, pra mim, é uma coisa profundamente trágica e aí que surge essa divergência entre ciência e religião, não quando as duas são vistas pelo que realmente são, que é a expressão que a gente tem de, maravilhamento com a existência humana e com o mundo que a gente vive.”  Portanto, as palavras do entrevistado foram precisas, nem ciência, filosofia ou religião, ou, o próprio mito são capazes de determinarem a plenitude do mistério humano. O caminho da ciência é um, o da religião outro, e, portanto, ambos, distintos, do senso comum. Mas preciso esclarecer algo, em todas essas esferas, paira a ignorância. Por isso, cuidado, quem está seguro em cima do muro, pode cair.
Também, a contemporaneidade está carregada de mitos, lendas, fábulas sobre a política, artes, letras, economia - bolsas de valores, mercado, escola, a educação e sobre o mundo inovador das novas tecnologias e, de um suposto aprendizado. Ainda, sobre o mito, no mundo grego, especificamente, sob esse chão imaginário e fabuloso que as respostas eram dadas, contudo, elas buscavam em certo sentido, responder as angústias e interrogações humanas.
Entretanto, qualquer conceito é sempre criado em determinada época e, com o passar dos tempos, o conceito pode ampliar, variar, diversificar, pluralizar e, etc. E, por falar em conceito, adianto: filosofia, em suma, é criação de conceitos. Diferentemente das demais ciências, a filosofia não tem pretensão de resolver e nem dar soluções aos problemas os quais se defronta o homem. A filosofia não é uma bola de cristal, nem uma mãe joana. Ela não traz em sua bagagem respostas para as perguntas, muito menos, é uma detentora de soluções. É preciso compreender de uma vez por todas, não existe filosofia da educação, ou, filosofia da ciência, da história, da idade medieval, da robótica, da contemporaneidade, do acaso ou do absurdo. O que existe é a filosofia e o que dela se desprende. O que disso passa, são apenas formas didáticas ou metodológicas para pensar determinadas realidades específicas, só isso. Quem busca resposta é a ciência, a filosofia está longe disso, longe de obtenção de respostas. A filosofia não é uma ciência, é um conhecimento, denominado conhecimento filosófico. A filosofia é a arte de formar, de inventar, de fabricar conceitos, ela traça, inventa e cria os conceitos. Essa noção de filosofia é de Gilles Deleuze e Felix Guattarri (2004). Ao contrário daquelas ou daqueles filósofos/as que tocam harpas com os anjos, afirmam eles/as: fazer filosofia é ficar a olhar o céu, a natureza, o universo, os seres para encontrar respostas. Nesse sentido, estou em total desacordo com eles e elas. Abro parêntese, não estou generalizando, as filósofas são raras, poucas, entretanto, geniais. Lembram do filme, de Hipátia de Alexandria a primeira mulher filósofa e matemática. Simone de Beauvoir (1908-1986), Rosa de Luxemburgo (1871-1919), Hannah Arendt (1906-1975), Anne Conway (1631-1679), Donna Haraway (1944). Simone de Beauvoir afirmou em sua época “Era-me mais fácil imaginar um mundo sem criador do que um criador carregado com todas as contradições do mundo.” A genialidade de Hannah Arendt floresce quando afirma, ao tentar falar de um ousado tema, “O que me perturba é que eu me atreva a abordá-lo, porque não tenho a pretensão nem a ambição de ser uma filósofa, ou ser incluída entre aqueles que Kant, não sem ironia chamava Denker von Gewerbe (pensadores profissionais).” A moça sabe o caminha dela! Lindo isso! Enfatizo, quem busca ou determina a resposta é a ciência, a filosofia está longe disso. A filosofia não é uma ciência. Entendida como conhecimento, a filosofia é a arte de formar, de inventar, de fabricar conceitos, ela traça, inventa e cria os conceitos. Ao longo de nossas lições vamos aprofundar um pouco mais acerca de seu sentido e de seu plano que a sustenta.
Sobre a religião, basta prestar atenção nas palavras do físico Marcelo Gleiser, para ele, enquanto a ciência é um flerte com o mistério, a religião deve conter em seu lugar. Daí, afirmo, a religião deve tão-somente basta acender a vela da fé, porém, na igreja. A escola não é templo. A historinha de Jesus Cristo repete isso algumas vezes para os parasitas e surdos: “[...] quando orares, entre no teu quarto e em silêncio ore ao senhor teu Deus, que, em silêncio, observa tudo e, te recompensará. O templo faz parte dessa história, as igrejas devem sim fazer o que se deve fazer e os fiéis devem orar e louvar juntos. A narrativa do evangelho que contempla o tal Jesus, no qual afirmou: “Não faça da casa de meu pai um covil de ladrões, muito menos um mercado” Isso é claro! Vou ter que desenhar qualquer dia. Escola é escola, Igreja é igreja. Você já leu em algum lugar na historinha de Jesus que esse, entrou numa escola para ensinar alguma coisa? É cada uma que parece duas, dizia meu pai.
Sobre o senso comum, de cara é preciso distinguir, senso comum da ciência, da filosofia, da religião. Sempre ensino, fazer filosofia é saber distinguir o porco do leitão. Porco é porco, leitão é leitão. O cara que me diz que é tudo a mesma coisa, logo desconfio. Sou de Minas Gerais, bicho cabreiro e desconfiado. Se porco fosse leitão, então, para que criamos o conceito de leitão? Que coisa maluca! Depois sobram para os pobres filósofos a dimensão da loucura. Gostaria de um último esclarecimento: o senso comum, ou seja, aquilo que a maioria das pessoas compreendem, é totalmente diferente das estatísticas, do ibope. Tem algumas pessoas que entendem que aquilo que dá ibope, é aquilo que é bom, é aquilo que mita!